Autor: Maria Carolina Vieira.

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Mario Schenberg viveu uma vida intensa, de atuação marcante nas décadas de grande efervescência cultural no Brasil dos anos trinta aos anos setenta, atuando diretamente na ciência, formação de cientistas e instituições, na política, na promoção e interpretação das artes e de artistas. Professor Catedrático da Universidade de São Paulo, desde 1944, estabeleceu a prática da física teórica e matemática no Brasil.


Pioneirismo na Física Teórica no Brasil.


Vida e obra de Mário Schenberg: da física à política e às artes.

Anos 30 – início da carreira.

Mário Schenberg foi um físico brasileiro que se destacou principalmente pelo pioneirismo na Física Teórica e Matemática. Nascido em 1914 em Recife e falecido em 1990 em São Paulo, dedicou-se por toda vida não só à ciência - tanto no que diz respeito a sua área de atuação, a física, quanto na formação de cientistas – mas também às artes, como crítico, e à política. Teve artigos publicados em inúmeras línguas (italiano, francês, inglês e português, em revistas européias, norte-americanas e brasileiras, participando ainda de conferências no Japão), desde 1936, no inicio da carreira, até 1978.

Seus estudos em Engenharia começaram em 1931, ainda em Recife. Dois anos depois, mudou-se para a Escola Politécnica de São Paulo, onde se formou Engenheiro Elétrico e também Bacharel em Matemática, na primeira turma da Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras, na então recém inaugurada Universidade de São Paulo.

Durante a graduação, Mario iniciou seus contatos internacionais e, entre eles, dois nomes foram de grande influência em sua obra: a dos professores italianos formadores do Departamento de Física da Faculdade de Filosofia da USP, Gleb Wataghin e Giuseppe Occhialini. Essas parcerias possibilitaram a discussão de questões fundamentais das teorias físicas dos anos trinta, como as sobre forças nucleares e partículas elementares que as materializam, por exemplo. Mario Schenberg fez parte de todo esse processo da construção do estudo da física no Brasil, sendo, inclusive, assistente do professor Wataghin na universidade.

Década de 40 – Universidade de São Paulo e Universidade de Bruxelas

Em 1944, Mario tornou-se professor catedrático de Mecânica Racional e Celeste na USP, defendendo em concurso público a tese nomeada “Princípios da Mecânica”. Nesse período, ele chegou a passar uma curta temporada como bolsista da Fundação Gunggenhem, nos Estados Unidos. Principalmente na Universidade de Chicago, desenvolveu trabalhos fundamentais em astrofísica sobre a origem e evolução das estrelas com o professor Chandrasekhar, futuro ganhador do prêmio Nobel.

Em sua volta ao Brasil, ele começou também a atuar na política, filiando-se ao Partido Comunista Brasileiro e elegendo-se, por duas vezes, deputado estadual. Como membro da Assembléia Constituinte do Estado de São Paulo, contribuiu para a aprovação do artigo que levaria à fundação da FAPESP – Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo.

Ainda na década de 40, Mario Schenberg é convidado por Occhialini a trabalhar como físico teórico do grupo de raios cósmicos na Universidade de Bruxelas, na Bélgica. A temporada de estudos na Europa provou-se muito produtiva: ao mesmo tempo que publicava como nunca seus artigos sobre Mecânica Quântica, Segunda Quantização e Mecânica Estatística Clássica nas mais variadas revistas européias, Mario aproveitou para viajar e aprofundar seus conhecimentos gerais sobre a arte européia e a dos países africanos e asiáticos expostas em museus europeus. Na Universidade de Bruxelas, ele era conhecido como o “teórico da casa”.

Décadas de 50 e 60 – Departamento de Física e perseguições políticas

Novamente no Brasil, Mario Schenberg ocupou, entre os anos de 1953 e 1961, o cargo de diretor do Departamento de Física da Faculdade de Filosofia da USP. Sua gestão foi marcada pela criação de vários laboratórios, entre eles o Laboratório de Pesquisas em Estado Sólido e Baixas Temperaturas, hoje localizado na cidade universitária do campus de São Paulo, no prédio que leva seu nome. Ele também atuou na compra do primeiro computador de pesquisa da universidade, além de trazer ao departamento o pesquisador de renome Cesar Lattes, que recriou um grupo de estudos em raios cósmicos. Ainda nas décadas de 50 e 60, Mario foi membro do Centro Brasileiro de Pesquisas Físicas, CBPF, no Rio de Janeiro.

A partir de 1964, devido às mudanças políticas que estavam ocorrendo no Brasil, a vida acadêmica de Mario Schenberg sofreu grandes reviravoltas: seus direitos políticos foram cassados e ele perdeu o cargo de professor da USP por dez anos, sendo proibido até mesmo de freqüentar a universidade. O físico ainda chegou a ser preso por vários meses em 1964 e por toda a década de 70 enfrentou perseguições e ameaças à sua integridade física.

Porém, mesmo com todas essas adversidades, Mario continuou atuando na vida científica do Brasil. Em carta a Clarice Lispector, ele conta que reagiu de modo criativo à “aposentadoria”, retomando com mais energia pesquisas anteriores da área física e também artística. Ainda ajudou a fundar a Sociedade Brasileira de Física, em 1966, tornando-se presidente em 1978. No ano seguinte, com a abertura política, ele finalmente pôde voltar à Universidade de São Paulo.

Década de 70 – de volta às salas de aula e últimas homenagens

Na etapa final de sua carreira, Mario ministrou a disciplina “Evolução dos Conceitos da Física”, reflexo de uma vida de estudos sobre física teórica. Essas aulas acabaram dando origens ao livro “Pensando a Física”. Ele ainda ganhou, em 1983, o prêmio do Conselho Nacional de Pesquisas, para Ciência e Tecnologia, e recebeu, em 1984, ano em que completava 70 anos de vida, uma grande homenagem, por meio do Simpósio Internacional em Homenagem aos 70 Anos de Mario Schenberg, onde se reuniram grandes físicos do Brasil inteiro.

Mario faleceu no dia 10 de novembro de 1990, não sem antes deixar uma herança de peso para a ciência no Brasil. Foi pioneiro nos estudos de física teórica e seus estudos sobre Astrofísica são publicados em livros didáticos; existem laboratórios e prédios batizados com seu nome; na década de 90 foi realizada a exposição “O Mundo de Mario Schenberg” sobre sua vida e suas atividades; existem grupos de estudo sobre seu legado até hoje e ele continua sendo inspiração como personalidade multidisciplinar, que conseguiu unir os conhecimentos em física às artes, à filosofia e à política, tornando-se um ser humano de pensamento completo. Suas idéias provam-se muito à frente do seu tempo, quando defendia o fim da era tecnicista e a hora da aproximação do homem com a natureza.

Cronologia

1914 – nasce em Recife Mario Schenberg.
1931 – inicia seus estudos em Engenharia, em Recife.
1933 – muda-se para a Escola Politécnica de São Paulo.
1943 – escreve “O Destino das Nações Unidas”.
1944 – torna-se catedrático da USP.
1947 – participa da banca que funda a FAPESP.
1947 – vai para Bruxelas.
1953 – torna-se diretor do Departamento de Física da USP (criação de laboratórios).
1960 – desenvolve pesquisas com raios cósmicos.
1964 – é preso por vários meses.
1969 – tem seus direitos cassados e é proibido de freqüentar a universidade.
1970 – idealiza uma instituição universitária que tivesse em estatuto a liberdade de produção e de interações entre pesquisadores, nos moldes do Instituto de Estudos Avançados de Princeton, afastado da universidade.
1966 - ajuda a fundar a Sociedade Brasileira de Física, da qual foi presidente em 1978.
1979 – volta a dar aula.
1983 – ganha o Prêmio do Conselho Nacional de Pesquisas para Ciência e Tecnologia.
1984 - é homenageado com um Simpósio Internacional pelos setenta anos de vida.
1990 – falece em São Paulo, no dia 10 de novembro.

Referências:
MÁRIO SCHENBERG: Entrevista de Amélia Império Hamburger (Instituto de Física, USP) publicada em julho/agosto de 1984. Disponível em: <http://www.canalciencia.ibict.br/notaveis/txt.php?id=71>. Acesso em: 01 dez. 2010.

FLEMING, H. O último trabalho de Mário Schenberg. Revista USP, São Paulo, n. 50, jul. 2001. Disponível em: <http://www.hfleming.com/schenberg.shtml>. Acesso em: 01 dez. 2010.

HAMBURGUER, A. I. Anotações e Documentos: Breve Biografia Acadêmica. In: HAMBURGUER, A. I. Obra Cientifica De Mario Schenberg. São Paulo: Edusp, 2009. Pion. Acesso em: 01 dez. 2010.

HAMBURGUER, A. I. Obra Cientifica De Mario Schenberg. São Paulo: Edusp, 2009. [A obra na livraria Cultura]