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A Sociedade Brasileira de Física vem a público manifestar preocupação quanto à Reforma do Ensino Médio por meio de Medida Provisória encaminhada ao Congresso Nacional. Reconhecemos a necessidade e urgência de reforma. Entretanto, por também reconhecer a complexidade do tema e a necessidade de construir, por meio de debate público qualificado, elementos para a sustentação de mudanças efetivas e eficazes, entendemos que tal questão não deve ser apreciada em caráter de Medida Provisória.

Consideramos que aspectos da MP 746 atentam contra os objetivos preconizados, quais sejam, a ampliação do tempo de escolarização e a necessidade de se pensar um Ensino Médio que seja atraente, flexível e atenda aos interesses e demandas de formação dos estudantes.

Dentre eles, destacamos:

  1. A MP estabelece como condição para exercício da docência “trabalhadores em educação, portadores de diploma de curso técnico ou superior em área pedagógica ou afim” e, para a parte técnica do currículo, outros profissionais, que, mesmo sem ter a qualificação profissional requerida, “detenham notório saber”. Assim, em lugar de indicar ações efetivas para formação de professores e estímulo à entrada e permanência na carreira, a MP apenas legitima  a precarização hoje existente  – segundo o censo de 2015, quase 40% dos professores em exercício não tem formação adequada para as disciplinas que lecionam. No caso da Física, esse número é de 68,7%. A SBF reafirma a necessidade de fortalecer a formação de professores com cursos de licenciaturas específicas nas áreas de conhecimento e condições de trabalho e carreira que tornem a profissão atraente.
  2. A MP reduz o componente de formação geral, destinada aos conteúdos da Base Nacional Comum Curricular (BNCC), das atuais 2400 horas para  1200 horas. Ou seja, a formação geral, cultural e científica dos estudantes é reduzida pela metade e não ampliada, como se anuncia. O tempo restante se volta para uma preparação para o  mercado de trabalho, sem qualquer alusão a outro princípio educativo. Não há espaço, no novo Ensino Médio anunciado, para formação ética, estética e científica dos estudantes. A ampliação referida pela MP é da carga horária anual mínima fomentando a implementação das Escolas de Ensino Médio em tempo integral.
  3. A proposta não estabelece a obrigatoriedade de oferta dos componentes curriculares em todas as escolas ou sequer de todas as áreas de conhecimento. A flexibilização pretendida não pode privar os estudantes do acesso ao conhecimento, como na prática poderá ocorrer com o Novo Ensino Médio anunciado.  A proposta estabelece como única obrigatoriedade da escola a oferta de Matemática, Língua Portuguesa e Língua Inglesa. Assim, escolas poderão simplesmente abolir a oferta de componentes como Física, Química, Sociologia, Filosofia, História, Artes, Educação Física, Biologia…  A gravidade desse fato dispensa maiores comentários.
  4. A MP não menciona aspectos fundamentais para um projeto de reforma do Ensino Médio tais como:
    a)  Ações e diretrizes para formação de professores e valorização da carreira docente.
    b)  Condições materiais e organizacionais para que as escolas possam oferecer, com qualidade, currículos amplos e diversificados;
    c) Indicações sobre a oferta de Ensino Médio noturno (30% das matrículas atuais);
    d) Indicação de diretrizes para projetos de escola integrada ou de tempo integral ou indicação de legislação complementar a este respeito. O projeto parece desconhecer as avaliações de políticas públicas e projetos em andamento em vários estados e munícipios brasileiros.
  5. MP menciona a BNCC que, entretanto, não está ainda regulamentada. Os princípios da BNCC,  que constam no texto aprovado após consulta pública,  não estão sendo considerados. Do mesmo modo, a  extensão de conhecimentos propostos na BNCC são incompatíveis com as 1200 horas anunciadas.

Por esta razão, a SBF vem a público se manifestar contra a forma e os termos com que foi apresentada a Reforma e recomenda a retomada, em caráter de urgência, das discussões sobre um Projeto de Lei de Reforma do Ensino Médio brasileiro, com amplo debate com a sociedade e qualificada participação de especialistas e entidades científicas.