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Coordenador do Laboratório de Inteligência Artificial Aplicada do CBPF, Clécio Roque De Bom, recebeu o Prêmio Pesquisador na 10ª edição da Brazil Conference nos Estados Unidos. Crédito Divulgação

Clécio Roque De Bom, Coordenador do Laboratório de Inteligência Artificial Aplicada do CBPF, defende a IA para além do medo da modificação que provocará no mercado de trabalho

A Inteligência Artificial (IA) está sendo vista de uma perspectiva negativa hoje, pois provocará profundas mudanças no mercado de trabalho. No entanto, ela também possibilita a análise de dados na ciência de uma forma que não era possível de se imaginar. A opinião é do astrônomo e professor do Centro Brasileiro de Pesquisas Físicas (CBPF), Clécio Roque De Bom, que recebeu o Prêmio Pesquisador na 10ª edição da Brazil Conference, evento realizado entre 6 a 7 de abril na Harvard University e no Massachusetts Institute of Technology (MIT).

Coordenador do Laboratório de Inteligência Artificial Aplicada do CBPF, De Bom acredita na diversidade na formação de equipes, defende o novo concurso público do órgão e aposta na captação de recursos para a ciência básica sob o argumento de que ela pode criar tecnologias que acabam servindo à humanidade mesmo não sendo o motivo de uma pesquisa fundamental. Leia abaixo uma breve entrevista por e-mail com o professor do CBPF:

Em um vídeo de divulgação no YouTube do CBPF, você afirma sobre a importância da diversidade na ciência, desde a equidade de gênero à classe social. Quais são os incentivos que o CBPF fornece hoje para a existência de equipes nas quais a diversidade está presente? Há bolsas de estudo, há parcerias com escolas públicas e privadas, ações em áreas carentes?

O CBPF é um centro de Pesquisa ligado diretamente ao MCTI que possui algumas iniciativas na área de educação e popularização da ciência, recebendo, por exemplo, escolas públicas e promovendo exposições. Dentre as atividades de popularização da ciência, o CBPF também lançou ano passado o primeiro livro de Física em Braile. Existem também programas de vocação científica para alunos de ensino médio que contam com escolas públicas. Além disso, o atual concurso público, o maior concurso da história da instituição, conta com cotas afirmativas, conforme a legislação. No meu caso eu procurei a diversidade de maneira proposital por acreditar nela. Pessoas diferentes trazem histórias e ideias diferentes além de trazer resiliência ao grupo e compartilhamento de experiências de aprendizado.

Muitos acreditam que a IA acabará com vagas de trabalho, preocupação que perpassa de médicos, físicos a jornalistas. E você diz justamente o contrário: a IA poderá representar a inclusão de novos talentos no mercado de trabalho. De qual forma a IA poderá impulsionar novos talentos?

A extensão da revolução trazida pela Inteligência Artificial não está completamente definida. Ninguém poderia imaginar que nós usaríamos o celular pra encontrar o caminho no mapa e fazer mercado nos primeiros anos. Existe muito foco no aspecto negativo porque a automatização trazida pela IA está e vai mudar o mundo do trabalho. Essas relações sofrerão ajustes e precisaremos nos preparar como sociedade para nos adaptar. Na minha fala, eu estou tentando mostrar que dali também surgem oportunidades. IA não é só automatizar o que existe é uma ferramenta que permite fazer ciência e análises antes impensáveis, modelizar o dado o que até bem pouco tempo não poderia ser tratado.

Comparo a ciência básica à poesia, pois investigam o que há de insondável seja na natureza ou nas nossas almas. Apesar que, no caso da poesia, Paulo Leminski dizia que ela não servia para absolutamente nada! Exageros à parte, entendo a importância da ciência básica, e que também ela nos deu diversas aplicações que hoje usamos no cotidiano, aplicações muitas vezes que não tinham qualquer relação sobre o tema investigado. E, por isso, não é arriscado aliar a importância da ciência básica às suas aplicações, como você argumenta no vídeo divulgado no YouTube do CBPF, ainda mais quando há diálogo com empresas, que nem sempre incluem em seus balanços um, digamos, “lucro com fim social”? Conte-me sobre essa perspectiva para amplificar a importância da ciência básica e a estratégia de suas aplicações?

Acredito que cientistas como eu que atuam em ciência fundamental em geral não o fazem por ser útil e sim pela sua curiosidade ou pela sua beleza em um sentimento que, na minha opinião, se aproxima da arte. No entanto, de forma pragmática, a ciência não é majoritariamente apoiada por governos e pela sociedade para além da academia por esses motivos. E sim porque a ciência fundamental é base para tecnologias disruptivas de hoje e do futuro. Essa é a razão que fez com que centros de física se multiplicassem no século XX. Eu tento mostrar, de forma mais explícita, essa relação e que é preciso portanto defender a ciência não aplicada para que sejamos uma sociedade mais competitiva tecnologicamente no palco do mundo.

(Colaborou Roger Marzochi)