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No que provavelmente foi a mais previsível escolha do Nobel das últimas décadas, Peter W. Higgs e François Englert foram anunciados como os vencedores da premiação em Física deste ano. Não houve surpresas em vista da enorme repercussão da descoberta do chamado bóson de Higgs em julho do ano passado e sua confrirmação definitiva em março deste ano. O achado foi conduzido no LHC (Large Hadron Collider), o maior acelerador de partículas jamais construído, e baseou-se em dados de dois experimentos (CMS e ATLAS), ambos com participação brasileira.

Englert (em parceria com Robert Brout, que já morreu) e Higgs propuseram independentemente, em 1964, a teoria que explica como todas as outras partículas do chamado Modelo Padrão adquirem massa: ela seria gerada por um campo associado a uma partícula até então desconhecida, um bóson.

Condições para observação dessa partícula passam por sua criação como subproduto das colisões entre partículas estáveis. Segundo a teoria agora premiada, o processo requer energias de colisão extremamente altas. O LHC foi projetado e construído pelo CERN (European Organization for Nuclear Research, localizado na fronteira entre a Suíça e a França) justamente visando e de fato atingindo as energias previstas para atender às condições. Com sua confirmação, o chamado Modelo Padrão da física de partículas ficou completo. Trata-se de uma das mais bem-sucedidas teorias da história da ciência, capaz de prever com precisão o comportamento das interações ligadas às forças da natureza, exceto a gravitacional.

Com a confirmação experimental do bóson de Higgs, as pesquisas na área de altas energias voltam-se agora ao mundo além do Modelo Padrão. Entre os grandes desafios estão o estudo da natureza da matéria escura e da energia escura. Para bases científicas sobre o tema do Nobel de Física, clique aqui (PDF, em inglês).

Jogo rápido com Rogério Rosenfeld (IFT-UNESP) sobre a escolha do Nobel em Física de 2013

SBF – A premiação deste ano está em boas mãos?
Rogerio Rosenfeld
 – Sim, os trabalhos de Brout e Englert e, independentemente, de Higgs introduziram um modelo de quebra de simetria que é um paradigma para todos os modelos em Física de Partículas Elementares, mesmo os que vão além do Modelo Padrão.

SBF – Por praxe, as descobertas da física teórica exigem comprovação experimental para ganharem o Nobel. No caso do Higgs, foi uma espera de quase meio século. A tendência na física de partículas, rumando cada vez mais para altas energias, é que fique cada vez mais difícil para um teórico viver por tempo suficiente para ver sua teoria confirmada?
Rosenfeld
 – Existem duas maneiras de se encontrar fenômenos novos em Física de Partículas. A primeira é produzir as novas partículas diretamente, o que requer experimentos com energia suficientemente alta, da ordem da massa da nova partícula. A segunda maneira é a de buscar efeitos indiretos das novas partículas, que se manifestam em nível quântico em experimentos de baixas energias – mas esses efeitos são muito pequenos e requerem uma enorme precisão. É preciso lembrar também que nem sempre novas teorias preveem a existência de uma nova física em escalas de energias muito altas. Um exemplo é o de uma partícula conhecida como áxion, candidata à matéria escura no universo, que é extremamente leve mas difícil de ser produzida e detectada.

SBF – O bóson de Higgs foi uma das grandes motivações para a construção do LHC. Com o objetivo atingido, para onde ruma a área agora?
Rosenfeld 
– Sabemos que o Modelo Padrão é insatisfatório, pois não contempla a existência de matéria escura, energia escura, massa dos neutrinos e não explica porque a massa do bóson de Higgs é tão menor que outras grandes escalas de energia, como a escala de Planck. Existem motivos de sobra para estender o Modelo Padrão e muitas dessas extensões foram propostas. Essas extensões incorporam ideias que podem revolucionar a Física, como a existência de dimensões extras compactas ou de novas simetrias da Natureza. O LHC já está testando experimentalmente essas extensões do Modelo Padrão, colocando até o momento limites em alguns de seus parâmetros. O que já sabemos é que qualquer dessas extensões deve conter o Modelo Padrão como uma boa aproximação para satisfazer os dados experimentais. Esperamos que, quando o LHC voltar a funcionar novamente em 2015 com uma energia maior do que a obtida em 2012, novos fenômenos sejam encontrados, que revolucionem nosso conhecimento sobre a Natureza. Mas não há garantias de que isso vá ocorrer.