A Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC), ao lado da Academia Brasileira de Ciências (ABC), da Sociedade Brasileira de Física (SBF) e da Sociedade Brasileira de Química (SBQ) divulgaram nesta segunda-feira, 13 de outubro, uma nota conjunta em defesa da Constituição Federal e contra a proposta de emenda que pretende autorizar o desenvolvimento de armas nucleares no Brasil.
A manifestação é uma resposta à PEC apresentada nesta semana pelo deputado federal Kim Kataguiri (União Brasil – SP), que sugere permitir o uso da tecnologia nuclear para fins de defesa nacional em caso de ataques. A proposta, apelidada nas redes de “PEC da bomba atômica”, permitiria que as Forças Armadas desenvolvessem armamentos nucleares mediante autorização presidencial.
No documento, as quatro entidades reafirmam o compromisso histórico da ciência brasileira com o uso exclusivamente pacífico da energia nuclear, um princípio consagrado na Constituição de 1988.
As instituições alertam que alterar essa norma seria um “retrocesso civilizatório”, com impactos éticos, diplomáticos e morais graves, além de violar tratados internacionais que tornaram a América Latina uma zona livre de armas atômicas.
“O Brasil, que construiu sua reputação internacional como nação promotora da paz e da cooperação científica, não precisa de bombas atômicas para ser soberano. Precisa, sim, de investimentos em educação, saúde, ciência e inovação, os verdadeiros pilares da soberania moderna”, argumentam na nota.
As entidades conclamam, por fim, o Congresso Nacional a “rejeitar integralmente” a proposta e a reafirmar o compromisso do Brasil com a paz, a democracia e o uso responsável da ciência e da tecnologia.
Leia abaixo a manifestação na íntegra
EM DEFESA DA CONSTITUIÇÃO E CONTRA A LEGALIZAÇÃO DE ARMAS NUCLEARES NO BRASIL
A Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC), a Academia Brasileira de Ciências (ABC), a Sociedade Brasileira de Física (SBF) e a Sociedade Brasileira de Química (SBQ) manifestam seu repúdio veemente à proposta de emenda constitucional que pretende permitir o desenvolvimento de armas nucleares no Brasil.
A Constituição Federal de 1988, conquista histórica da sociedade brasileira, consagrou o princípio do uso exclusivamente pacífico da energia nuclear, uma conquista assegurada graças à mobilização de cientistas, educadores e movimentos sociais, liderados por entidades como a SBPC, ABC, SBF e SBQ. Esse dispositivo, inscrito no artigo 21, inciso XXIII, alínea “a”, é uma das expressões mais elevadas do compromisso do país com a paz, a ética e o desenvolvimento responsável da ciência.
Revogar essa proibição significaria um retrocesso civilizatório, com consequências jurídicas, diplomáticas e morais irreparáveis. A proposta em discussão ameaça desmontar compromissos internacionais que o Brasil ajudou a construir, entre eles, o Tratado de Não-Proliferação de Armas Nucleares (TNP) e o Tratado de Tlatelolco, que fizeram da América Latina uma zona livre de armas atômicas. Romper com esses tratados não apenas violaria obrigações internacionais, como colocaria o país em rota de isolamento diplomático e perda de credibilidade global.
As armas nucleares representam a antítese da ciência e da vida. São instrumentos de destruição em massa, cujas consequências humanas, ambientais e intergeracionais são incalculáveis. O Brasil, que construiu sua reputação internacional como nação promotora da paz e da cooperação científica, não precisa de bombas atômicas para ser soberano. Precisa, sim, de investimentos em educação, saúde, ciência e inovação, os verdadeiros pilares da soberania moderna.
A justificativa de “dissuasão estratégica” é tecnicamente inconsistente e eticamente inaceitável. Nenhum país ganha segurança ao entrar em uma corrida nuclear. O custo de um programa bélico desse tipo seria astronômico, desviando recursos escassos das áreas que realmente constroem o futuro nacional.
O Brasil deve reafirmar sua liderança ética, científica e pacífica no uso do átomo, fiel ao espírito de sua Constituição e à tradição diplomática que o consagrou como nação promotora da paz e da cooperação entre os povos. Trair esse princípio seria romper com um legado de responsabilidade e lucidez científica que nos distingue no cenário internacional.
Em nome da Constituição, da ciência e da humanidade, conclamamos o Congresso Nacional a rejeitar integralmente essa PEC e a reafirmar o compromisso do país com a paz, a democracia e o uso responsável da energia nuclear e da tecnologia.
13 de outubro de 2025
FRANCILENE PROCÓPIO GARCIA
Presidente da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC)HELENA BONCIANI NADER
Presidente da Academia Brasileira de Ciências (ABC)SYLVIO CANUTO
Presidente da Sociedade Brasileira de Física (SBF)ROSSIMIRIAM PEREIRA DE FREITAS
Presidente da Sociedade Brasileira de Química (SBQ)
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Por Jornal da Ciência/SBPC