Categorias

Posts recentes

Método inovador faz com que as ondas eletromagnéticas sejam amplificadas em uma única direção, gerando um efeito que pode contribuir no futuro com novas tecnologias de computação e comunicação

Um transistor clássico, desses usados em nossos equipamentos eletrônicos atuais, são caracterizados por amplificar sinais elétricos. Seria possível fazer isso com a luz? Essa questão foi levantada em  por um grupo de pesquisadores liderado por Mário Silverinha, professor da Universidade de Lisboa e Instituto de Telecomunicações em Portugal, que em janeiro de 2022 publicou um artigo debatendo os materiais que poderiam realizar esse efeito. 

A busca por esses materiais ficou à cargo dos cientistas liderados pela brasileira Tatiana Gabriela Rappoport, professora associada da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) licenciada para atuar com Silverinha no Instituto de Telecomunicações e que hoje atua como pesquisadora na Universidade do Minho. O resultado do seu trabalho foi publicado em fevereiro de 2023 na Physical Review Letters no artigo Engineering Transistorlike Optical Gain in Two-Dimensional Materials with Berry Curvature Dipoles.

De acordo com Tatiana, é possível que diversos materiais de duas dimensões – chamados assim pelo fato de sua espessura ser tão fina quanto a de um átomo – possam apresentar o efeito pretendido por Silverinha. Mas suas pesquisas tiveram início com o grafeno, um material muito fino e plano, composto por apenas uma camada de átomos de carbono organizados em uma estrutura hexagonal, como uma rede de colmeia. É essencialmente uma folha de carbono de apenas um átomo de espessura. Além dessas qualidades, cientistas descobriram formas interessantes de usar as folhas desse material.

Em 2018, um grupo de físicos liderado por Pablo Jarillo-Herrero, do Instituto de Tecnologia de Massachusetts (MIT), nos Estados Unidos, fizeram uma importante descoberta relacionada às propriedades do grafeno. A descoberta revelou que a sobreposição de múltiplas folhas de grafeno em um ângulo específico resulta na formação de “heteroestruturas de grafeno”, as quais demonstram características eletrônicas singulares não observadas em camadas individuais do material ou em arranjos distintos. Essas características incluem a criação de bandas de energia que exibem semelhanças com as encontradas em materiais supercondutores.

O ângulo de sobreposição entre as camadas de grafeno afeta as interações entre os elétrons nas camadas, levando a fenômenos como a formação de bandas de energia características e comportamento eletrônico altamente correlacionado. Essa descoberta, inclusive, ocorreu no mesmo ano em que a pesquisadora brasileira Aline Ramires e o espanhol Jose Lado, no Instituto Federal de Tecnologia de Zurique (ETH), na Suíça, fizeram pesquisas sobre a combinação de folhas de grafeno para criar e controlar estados exóticos de elétrons, como relata artigo da SBF à época. O tema, tão importante até hoje, foi motivo do Prêmio José Leite Lopes de melhor tese de doutorado concedido em 2017 à cientista Ingrid David Barcelos.

O fato é que a exploração das heteroestruturas abriu um novo campo de pesquisa e levou ao estudo detalhado de suas propriedades eletrônicas, ópticas e magnéticas com grande potencial de aplicações, incluindo eletrônica flexível, fotônica e detecção de luz. Em razão desse histórico, Tatiana buscou usar o grafeno no experimento com a luz e, também, para que fosse possível criar uma teoria simples para o fenômeno, que estimulasse novas pesquisas para a busca de outros materiais 2D que apresentem amplificação ainda maior da luz.

Com a aplicação de uma corrente elétrica no material pesquisado por Tatiana, que consiste em duas folhas de grafeno organizadas sobre certa angulação, a luz foi amplificada com sucesso e de forma direcional. “As propriedades sobre a simetria do grafeno são conhecidas. O grande mérito do nosso estudo é a amplificação da luz, um efeito novo: ao se aplicar corrente elétrica no material – e não precisa ser só grafeno – a luz que incide sobre ela é amplificada. E esse efeito é proporcional ao nível da corrente”, explica a cientista, que agora também busca outros materiais que apresentem esse tipo de propriedade. “No fundo, eu descobri as características necessárias básicas eletrônicas em duas dimensões. E vamos procurar outros materiais que possam amplificar a luz com ainda mais intensidade.”

(Colaborou Roger Marzochi)