UFMA levará ao espaço os nanossatélites Jussara K e Pion BR2 - Cientistas de Alcântara. (Foto: UFMA)

Em Alcântara, cidade há 91 quilômetros da capital São Luís, no Maranhão, a previsão do primeiro lançamento comercial de um foguete em solo brasileiro, que carregará nanossatélites de universidades e startups, está criando um frenesi entre alguns professores da Universidade Federal do Maranhão (UFMA) e, até mesmo, com alunos da cidade, seja no sentido de enviar mensagens ao espaço ou, até mesmo, captar informações básicas. Não chega a recordar o boom visto em 1986 com a venda de telescópios rudimentares após a ampla divulgação da passagem do cometa Halley, mas dá um sabor de que o lançamento, previsto para uma janela entre os dias 19 a 22 de dezembro, já ser um sucesso.

O governo brasileiro, em parceria com a Força Aérea Brasileira (FAB) já estão preparando a estrutura da Empresa de Projetos Aeroespaciais do Brasil (ALADA), que fará do País base de lançamento de satélites no Centro de Lançamento de Alcâncatara (CLA) e no Centro de Lançamento da Barreira do Inferno (CLBI), no Rio Grande do Norte.

Essa iniciativa é reflexo da um edital de chamamento público lançado pela AEB em 2020, voltado a empresas interessadas em realizar lançamentos a partir do CLA, no qual venceu a sul-coreana Innospace, que assinou contrato com o Comando da Aeronáutica (Comaer) em 2022. A operação que será realizada agora, em dezembro, foi batizada de Spaceward 2025.

“O processo simboliza a consolidação do modelo de parcerias público-privadas no setor espacial brasileiro e o fortalecimento do uso comercial do Centro de Lançamento de Alcântara”, afirma a AEB. A retomada do lançamento em Alcântara ocorre mais de 20 anos após o trágico acidente que vitimou diversos cientistas.

Um foguete HANBIT-Nano, de dois estágios, com 21,9 metros de comprimento, 1,4 metro de diâmetro e massa total de quase 20 toneladas, levará ao espaço cinco pequenos satélites e três experimentos tecnológicos desenvolvidos por empresas e instituições do Brasil, da Coreia do Sul e da Índia. De acordo com a AEB, os satélites serão utilizados para a coleta de dados climáticos e ambientais, para o desenvolvimento tecnológico e para iniciativas educacionais. Os experimentos serão submetidos a testes e coleta de dados em ambiente espacial.

É neste ponto que entram as universidades. A UFMA levará ao espaço os nanossatélites Jussara K e Pion BR2 – Cientistas de Alcântara. Esta feita em parceria com Pion Labs; aquela, realizada no Laboratório de Eletrônica e Sistemas Embarcados Espaciais (LABESEE) da UFMA. Já a Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC) verá nos céus o FloripaSat-2A e FloripaSat-2B, que serão colocados em órbita pela missão Spaceward 2025. Será a primeira vez que uma plataforma completa, projetada inteiramente pelo SpaceLab/UFSC, será testada em órbita.

A missão tem como objetivo principal a validação em órbita (IOV – In-Orbit Validation) de tecnologias desenvolvidas integralmente no próprio laboratório, consolidando a plataforma FloripaSat-2 como base para futuras missões científicas e acadêmicas. “Esses satélites representam o amadurecimento de uma linha de pesquisa que vem sendo construída há anos, unindo ciência, tecnologia e formação de pessoas”, diz o professor Eduardo Bezerra, coordenador do SpaceLab, em divulgação do portal da UFSC.

Há participação de estudantes, de grandes cientistas e de agências governamentais em todos esses projetos. O saboroso da história é que em Alcântara há pelo menos um professor e algumas crianças se preparando para projetar antenas que, ao menos, consiga registrar a passagem dos nanossatélites pela região, conta o professor do curso de Engenharia Aeroespacial da UFMA, Carlos Brito, em entrevista ao Boletim SBF.

“Nós temos um professor aqui da área de telemetria que tem uma antena dele, na casa dele instalada. E também ele pode fazer essas leituras até se passar um satélite. E também tem alguns alunos que vão tentar fazer, digamos assim, entre aspas, algum tipo de leitura algum tipo de coleta com antenas improvisadas”, explica o professor. Isso não quer dizer que pessoas não autorizadas tenham acesso aos dados coletados, mas sim que seria possível usar antenas simples para registrar a passagem de alguns nanossatélites pela área, que é um grande chamariz para a divulgação científica entre a população.

Segundo o professor, o Jussara-K é um CubeSat desenvolvido no LABESEE da UFMA e reúne diversas tecnologias nacionais. Entre elas estão as antenas produzidas em parceria com o Laboratório LISE, da Universidade Federal de São João Del-Rei (MG), e o sistema de energia, incluindo os painéis solares, fabricados no próprio laboratório da UFMA. Sua missão é coletar dados ambientais de plataformas terrestres equipadas com sensores em áreas de lagoas, florestas e regiões de cultivo. O satélite será capaz de captar informações como temperatura, umidade e níveis de monóxido de carbono, que são úteis para identificar focos de queimadas.

O Pion BR2 – Cientistas de Alcântara é fruto de uma parceria entre a UFMA, por meio do DARTi Lab e do BAITES,  a AEB, a Fundação Sousândrade, o Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD) e a startup brasileira PION, especializada em nanossatélites. O satélite nasceu do projeto “Cientistas de Alcântara”, que tem como  objetivo  aproximar as comunidades da cidade de Alcântara das tecnologias espaciais, com foco no protagonismo das crianças quilombolas, segundo informa o site da UFMA. O satélite levará ao espaço mensagens produzidas por cerca de 300 crianças participantes do projeto. Após o lançamento, o PION-BR2 – Cientistas de Alcântara enviará sinais que poderão ser captados por estações de telemetria em diversas partes do mundo.

Além disso, a UFMA pretende unificar as atuações do Jussara K com as do nanossatélite Aldebaran, criado para colaborar na busca por pequenas embarcações que possam se perder no mar. Como a região costeira do Maranhão têm muitos pescadores, a ideia é ter uma constelação de satélites para monitorar as suas embarcações.

O Jussara K poderá não apenas colaborar com a agricultura de subsistência da população amazônica, fazendo até a análise da riqueza do solo, mas também, em mar, unir esforços na busca por embarcações desaparecidas com o Aldebaran. Os dados críticos das missões serão transmitidos a uma estação montada na própria UFMA. “Os dois nanossatélites já podem começar a trabalhar como se fossem uma constelação.” Assim, crescem as chances do Brasil impulsionar o seu desenvolvimento a partir da conquista do espaço, uma luta travada há anos com amplos esforços da AEB e, especialmente, do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe).

(Colaborou Roger Marzochi)