Inspirado na trajetória do físico José Leite Lopes (1918–2006), defensor incansável da ciência e da democracia no Brasil, o Prêmio José Leite Lopes de Melhor Tese de Doutorado é a principal distinção acadêmica concedida anualmente pela Sociedade Brasileira de Física (SBF). Em 2025, o prêmio foi concedido a André Garcia Primo, da Unicamp, autor da tese “Dissipation on optomechanical systems: from optical forces to quantum networks”. A menção honrosa ficou com Natalí Soler Matubaro de Santi, da USP, pela tese “Métodos de aprendizado de máquina para obtenção de informações cosmológicas”.
Ambas as teses haviam sido selecionadas entre as sete vencedoras do Prêmio SBF de Teses de Doutorado, concedido em diferentes áreas da Física. Apenas duas delas concorrem ao José Leite Lopes, o prêmio mais abrangente, que reconhece a originalidade, profundidade e impacto científico do trabalho.
“Para mim, o prêmio é quase um sonho. Se você me perguntasse lá em 2013, quando entrei na graduação, se isso ia acontecer comigo, eu nunca teria imaginado”, diz André, que é físico formado pela Unicamp, com passagem pela Universidade Stanford (EUA) e hoje realiza pós-doutorado na École Polytechnique Fédérale de Lausanne, na Suíça.


Sob orientação do professor Thiago Alegre, André desenvolveu um trabalho de fronteira na área da óptica e da informação quântica, estudando sistemas optomecânicos, estruturas que acoplam vibrações mecânicas com luz em escalas nanométricas. “A ideia é usar esses sistemas como ponte entre baixas e altas frequências, conectando computadores quânticos a redes ópticas em escala metropolitana”, explica. A tese se insere no esforço global por criar redes quânticas capazes de transmitir informação a longas distâncias com segurança e estabilidade.
Já Natalí, formada na USP, mestra pela UFSCar e doutora pela USP, com orientação do professor Raul Abramo, aplicou métodos de aprendizado de máquina à cosmologia, desenvolvendo novas formas de estimar parâmetros do Universo. “Tentei resolver problemas tradicionais de outra forma. Por exemplo, tratei matrizes de covariância como imagens e usei visão computacional para reduzir ruídos. Também converti catálogos de galáxias em grafos para alimentar redes neurais de grafos”, conta.
A originalidade do método desenvolvido por Natalí está em sua capacidade de extrapolar modelos físicos: o algoritmo consegue identificar padrões cosmológicos mesmo quando muda-se o modelo do universo usado nas simulações. O resultado é uma ferramenta mais versátil e robusta para entender a estrutura do cosmos. Atualmente, ela se prepara para iniciar seu pós-doutorado na Universidade da Califórnia em Berkeley.
Para ambos os premiados, o reconhecimento é também um incentivo à divulgação científica. “Sempre gostei de divulgar meu trabalho, de tentar furar a bolha da academia e tornar o que fazemos mais acessível”, afirma André. Natalí concorda: “É importante mostrar para quem está começando — especialmente para mulheres, que ainda são minoria na Física, que é possível chegar lá. Na minha turma, éramos quatro mulheres entre 40 alunos.”
Os dois também fizeram questão de dividir o reconhecimento com suas equipes. “Doutorados são trabalhos feitos a muitas mãos”, lembra André. “Quero agradecer meu orientador, meus coorientadores, colegas da Unicamp, de Stanford, todo mundo que esteve junto.” Natalí reforça: “Eu brinco que meu trabalho é como um grafo: cada nó é uma pessoa que contribuiu. Desde os coautores dos artigos até quem compartilhou ideias.”
Mais do que prêmios individuais, os reconhecimentos dados pela SBF evidenciam a vitalidade da pesquisa feita no Brasil, mesmo em meio a restrições orçamentárias e desafios institucionais. A premiação é importante também por mostrar que a ciência não floresce no isolamento: é na coletividade que ela encontra sua força.
Assista à entrevista completa com os jovens cientistas
(Colaborou Roger Marzochi)